Trabalho no Contemporâneo

O público pergunta: “Como pensar a relação do trabalho, nas mais diversas possibilidades, no mundo contemporâneo?”

Quem responde é Eric Lecerf. Ele fala de como o trabalho é mais frequentemente mostrado no momento do desemprego, de dispensa, e de greves. “Eu diria que é no outro do trabalho que a alienação aparece mais. Não tenho resposta de como hoje nós podemos filmar. Vimos que nas relações no interior do trabalho existe um fenômeno há 10 anos que está girando em torno dos trabalhos de serviço, do emprego de domésticos.  Eu acho que o trabalho reinveste através deste viés”.

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Roger complementa  fala de Eric Lecerf, ao abordar a idéia do corpo do empregado. “Sabemos que no cinema a encarnação passa pelo corpo. Temos o corpo do policial mas, na maneira de narrar, existe uma dificuldade de criar o corpo do personagem”, diz.

Lecerf: “Falo do verdadeiro trabalho”

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Em resposta ao mediador da mesa, Lecerf  diz: “Nós podemos discordar destas questões. A relação trabalho-cinema em 1975, no 1º de maio, era uma. O primeiro ministro francês se suicidou e no dia seguinte, a primeira página dos jornais dizia que o ministro se suicidou. Na última página, um trabalhador desempregado também se suicidou e  o título era “morte na miséria”.

É um problema falso. Pode fazer documentário  e colocar na boca das pessoas o que queremos que se diga dela. Quando eu falo do trabalho, é o verdadeiro trabalho.

O cinema só pode pensar o trabalho porque tem uma relação específica com ele. O sistema pega um objeto e constitui uma mitologia do objeto. O trabalho nos permite construir uma relação fora do determinismo social”.

A TV e o Cinema

Roger finaliza sua fala citando a televisão. “Hoje a TV dá a imagem do mundo, e precisamos fazer a diferença entre a TV e o cinema”, diz. “O que diferencia não é a fabricação das imagens, a divisão que é uma diferença fundamental.  A TV não é escolha, não é um ato individual”.

A segunda diferença é que, se estamos de acordo que  o cinema é ontologicamente realista, do fato da realidade (o trem que entra a estação, dos Irmãos Lumiére), a televisão é o fato do direto.

“Na TV não se diz: eu mostro alguma coisa que vc vai acreditar q é verdade. No direto não existe julgamento possível. O fato direto é fundador da TV.  McLuhan dizia q a TV tornava o mundo uma cidade global. No direto não há julgamentos. Se conhece as regras antes. Se não conhecesse as regras antes, não iria entender nada. O perigo desse efeito direto é impedir o julgamento por não conhecer as regras. É mto importante  refletir sobre as imagens. O cinema ajuda a perceber essas imagens. Na TV nós mostramos o carro que passa e nunca o seu campo. Como julgar as imagens sem ter instrumentos para isso? Quando Godard fala que o cinema é uma forma que pensa.

Os governantes governam pela emoção, pelo menos o nosso (francês). Isso (o direto) é a negação do pensamento sobre a imagem. Penso que isso não seja muito legal. Então, Resistência”, finaliza.

Eric Lacef completa: “O que visamos como realidade é uma montagem!Eu acho que o cinema é o que engaja o trabalho. A transformação de uma realidade em liberdade. Só existe cinema quando existe desconstrução. A filosofia e o cinema tem a falar, não em seu poder, mas na sua dificuldade”.

O Público do Cinema

Lecerf fala da relação entre cinema e trabalho pelo público. O público é considerado desde a origem popular, um público de trabalhadores. Todo mundo poderia assistir a esse espetáculo. O cinema precede uma invenção tecnológica, ele não exige concentraçaõ especial. O cinema é o lugar onde as mais fortes sensações são experimentadas. Ele tem também uma virtude econômica, por ser mais barato que as outras formas de diversão. O cinema tem familiaridade com o nosso mundo, e um dos objetos do cinema seria tornar mentira a verdade, partir de um dado mecânico que tem familiaridade com o dado da fábrica.

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Jean Renoir fala da linguagem universal do cinema, em especial do cinema mudo. Hegel, uma das grandes  fontes do pensamento marxista, fala que o trabalho mudo é visto através da realização, isto é, é um cinema que mostra a máquina, os músculos.

Lecerf levanta uma questão: quando o cinema se torna falado, o que mostrar do trabalho? O filósofo fala da relação da palavra e do cinema, e daa dificuldade em filmar o trabalho. “Os trabalhadores são geralmente filmados em momentos de lazer, são personagens emblemáticos, criados na passagem do mudo ao falado”, diz. Ele cita um filme, de uma história de amor de um marinheiro. “O filme é ruim, mas permite a criação de um personagem do realismo poético francês dos anos 30. Mesmo na grande ilusão, ele é um trabalhador em confronto com os nobres “, explica.

Cinema e Trabalho

O assunto da vez é a relação entre trabalho e cinema. Acaba de ser exibido um “quase-documentário” produzido com imagens de trabalhadores da França nos inícios do cinema francês. São mostrados trabalhadores nos trigais, marinheiros lavando peças de navegação, uma siderurgia. “O trabalho se mostra em quatro planos diferentes: da formação ontológica, das necessidades, do plano econômico e o do valor. A ligação é o que chamamos na França de ‘lavanderia’, é a sociabilidade”, diz Lecerf.

No documentário é evidenciada também a força do turismo, e no último plano são mostrados cavalos — então uma grande ferramenta para o trabalho — atravessando a rua.